quinta-feira, agosto 16, 2007

AS ASSOCIAÇÕES E A DEFSA DO AMBIENTE

"Ecologia é ter o canto de uma ave na cabeça e os pés na terra"(Jean-Paul Ribes, "La Baleine")


1- A diversidade dos grupos “ecológicos”


O termo ecologia foi usado pela primeira vez, em 1866, pelo biólogo alemão Ernst Haeckel. A ecologia, que só a partir de 1919 deixou de ser um ramo da Biologia, pode ser definida como "a ciência que estuda as relações do homem com o meio ambiente vivo e a natureza que o envolve, a comunicação que se estabelece entre os organismos vivos, desde a mais pequena célula ao mais complexo sistema vivo".

A interacção existente entre sociedade e natureza fez com que, a partir de certo momento, a ecologia se tornasse, pouco a pouco, em actividade de intervenção política e social, em ecologismo - termo criado por Dominique Simonnet, em 1979, para distinguir ciência de actividade político/social.

Em suma, podemos distinguir duas vertentes no conceito de ecologia: a científica e a social. Estas "não podem ser entendidas numa antítese, mas sim como dois aspectos da mesma realidade global. A previsão científica permite orientar a intervenção social, e esta corrigir a primeira".

A intervenção social, por seu turno, pode ser vista segundo três perspectivas: a defensiva, a tecnocrática e a radical.

Os activistas que perfilham a perspectiva defensiva centram a sua preocupação nas diferentes formas de poluição, sendo contrários a todo o desenvolvimento e crescimento económico e social.

Os tecnocratas, por seu turno, defendem o modelo de desenvolvimento urbano e industrial da sociedade actual e actuam terapeuticamente sobre os diversos problemas. Por outras palavras, para eles, a ecologia não é mais do que uma simples técnica.

Por último, para os adeptos da perspectiva radical a ecologia é entendida como “filosofia dum outro modo de vida”. Sem por de parte as concepções anteriores os radicais consideram que a racionalização e a inovação tecnológica são insuficientes, e perfilham uma nova concepção do mundo em que as relações entre os homens, entre os homens e os outros seres vivos e entre os homens e o espaço sejam diferentes das actuais.

Actuando segundo uma ou mais do que uma das perspectivas referidas existem várias correntes de opinião das quais, entre outras, se destacam: o conservacionismo, o ambientalismo, a ecologia profunda, a ecologia política e a ecologia social.

O conservacionismo é a corrente que se preocupa essencialmente com a criação de áreas protegidas e com a protecção de espécies em perigo e é constituída essencialmente por amantes de natureza e da vida selvagem. Os mais conservadores consideram que a propriedade privada da terra e da água será a melhor maneira de as defender da poluição e destruição e a ala mais avançada (esquerda) admite a intervenção do estado para regulamentar os problemas ambientais.

O ambientalismo, cuja actuação se pode confundir com a ala avançada do conservacionismo, para além da conservação da natureza adopta um leque mais vasto de preocupações como os resíduos, a energia, os transportes, etc. Os ambientalistas que se caracterizam pela abordagem de problemas individualizados acreditam em soluções técnicas para os problemas ambientais e apelam constantemente ao estado para a criação de legislação protectora. A sua organização é essencialmente de carácter nacional e profissionalizada.

A ecologia profunda aparece como reacção às correntes anteriores, já que aquelas não questionam a chamada “filosofia dominante” da sociedade industrial. Os adeptos da ecologia profunda entendem que “ o valor da Terra, personificada em Gaia, é- lhe intrínseco, não depende da sua utilidade para os humanos” e consideram que os interesses económicos devem estar subordinados às considerações ecológicas. Esta corrente está mais interessada “ na alteração do estilo de vida, na auto- realização e espiritualidade, do que em mudanças política e sociais”.

O movimento da ecologia política aparece em 1972, na nova Zelândia, com a criação do primeiro partido verde. A ecologia política que se opõe à “ideologia do crescimento ilimitado e à acumulação infindável de bens em que assenta a sociedade de consumo actual” privilegia a actuação a nível local e regional a qual é combinada com a participação eleitoral que é concebida como acção educativa.

A ecologia social defende uma alternativa de administração ao estado centralizado, sendo o município “o lugar natural para modificações sociais, políticas e ambientais e o bairro e a cidade como a base duma nova política democrática”. De acordo com Murray Bookchin, o fundador desta corrente, “em vez de se continuar com um sistema de produção e consumo ostensivo e incontrolado” é “ necessário criar eco-
comunidades e eco- tecnologias para que possamos restabelecer o equilíbrio entre a humanidade e a natureza e inverter o processo de degradação da bioesfera” .


2- Os grupos “ecológicos” nos Açores


Nos Açores, a nível oficial, estão registadas diversas associações de defesa do ambiente. Contudo, algumas delas não desenvolvem qualquer actividade há alguns anos e para outras a defesa do ambiente é objectivo secundário.

A associação mais antiga, a Sociedade de Exploração Espeleológica “Os Montanheiros” que foi fundada em 1 de Dezembro de 1963 “tem por fim promover o conhecimento e divulgação de motivos naturais de interesse espeleológico ou paisagístico”, através da prática do campismo e do montanhismo. Os Montanheiros têm desempenhado um papel de relevo no apoio logístico a várias expedições cientificas no âmbito da espeleologia e têm denunciado atentados à natureza, sobretudo na ilha onde estão sediados, a Terceira.

O Centro de Jovens Naturalistas de Santa Maria, tem por objectivo, entre outros, incutir nos jovens o respeito pela Natureza, alertando-os para a necessidade da acção do homem não ser factor de desequilíbrio ecológico. A sua actividade, dirigida aos mais jovens, foi mais intensa nas décadas de 70 e 80. Hoje, apesar da persistência do Sr. Dalberto Teixeira Pombo, a sua actividade é muito reduzida.

A Associação Ecológica “Amigos dos Açores”, criada em Março de 1985, tem por objectivos defender a Natureza, o Ambiente e a Paz, contribuir para a construção de um mundo mais limpo, mais justo e pacífico, privilegiando para isso métodos de trabalho e de intervenção não- violentos. Com cerca de 820 associados, a sua acção, embora centrada na ilha de São Miguel, tem-se estendido a todas as ilhas, quer através dos seus associados quer através da colaboração com as escolas e autarquias. Cientes que só actuando em conjunto é possível exercer influência sobre as decisões tomadas a nível global, os Amigos dos Açores decidiram no início de 1993 aderir à Earthaction Network, organização internacional com mais de 700 associações filiadas em mais de 100 países.

A Azórica, associação de Defesa do Ambiente sediada no Faial foi criada no início da década de 90, tendo promovido nos dias 5 e 6 de Junho de 1993 o 1º Encontro das Associações de Defesa do Ambiente da Região Autónoma dos Açores, edita a revista “Moinho de Vento” e anualmente promove campanhas de limpeza do litoral. Mantém um protocolo de colaboração com a Câmara Municipal da Horta.

A meados da década de 90 (95?) surgiu na Terceira a Gê- Questa que tem denunciado vários atentados ao património natural e desenvolvido algumas acções de educação ambiental.

O núcleo de São Miguel da Quercus surgiu em Abril de 1994, aquando da Presidência Aberta do Dr. Mário Soares nos Açores. Tem elegido como principais temas de intervenção os resíduos e as lagoas.

O movimento SOS – Lagoas surgiu com o objectivo de alertar a opinião pública para o estado de degradação das Lagoas dos Açores, nomeadamente da Lagoa das Furnas, na ilha de São Miguel. As suas acções são esporádicas no tempo (92-94 e 99), curiosamente os pontos mais altos da sua actividade têm coincidido com as visitas dos Presidentes da República aos Açores. Ao contrário das organizações anteriores, este movimento não se encontra legalizado.

A título de curiosidade apresento alguns dados que poderão ajudar a caracterizar quem são os membros das Adas nos Açores.

Assim, no caso da Associação Amigos dos Açores, em termos etários, temos:

Para um total aproximado de 820 associados, 12 % possuem uma idade compreendida entre os 10 e os 20 anos, 20 % possuem uma idade compreendida entre os 20 e os 30 anos, 31% possuem uma idade compreendida entre os 30 e os 40 anos, 26 % possuem uma idade compreendida entre os 40 e os 50 anos e entre os 50 e os 83 anos existem 11% de associados.

Em termos profissionais, 36 % dos associados são professores do 1º, 2º ,3º ciclos e do ensino secundário e educadores de infância, 23% são estudantes dos diversos níveis de ensino, 6% são funcionários públicos, 5% são engenheiros, 4% são empregados de escritório, 4% são bancários, 2% são economistas e 2% são professores universitários.


3- As Associações de Defesa do Ambiente e a participação na vida colectiva



A responsabilidade pela promoção da qualidade do ambiente cabe a todos nós. Neste sentido, a Constituição da República Portuguesa desde 1976 reconhece a todos os cidadãos o direito a um ambiente ecologicamente equilibrado e o dever de o defender.

No campo legislativo, a aprovação pela Assembleia da República da Lei de Bases do Ambiente (Lei nº 11/87 de 7 de Abril) e da Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Lei nº 10/87 de 4 de Abril) veio abrir ao associativismo ambiental perspectivas que até então não se vislumbravam. A Lei das Associações de Defesa do Ambiente veio, finalmente, reconhecer o importante papel que cabe às mais diversas organizações independentes de cidadãos, dando-lhes meios para a acção. A lei institucionaliza o direito de participação e intervenção na definição da política do ambiente (art. 4º), o direito de consulta (art. 5º), o direito de acção administrativa (art. 6º), o direito de prevenção e controle (art. 7º), o direito de apoio do Estado, através da Administração central, regional e local (art. 9º), etc…


A 18 de Julho de 1998, com a aprovação da Lei nº35/98 a lei anterior foi aperfeiçoada, tendo, entre outras alterações, sido consagrado o estatuto de dirigente associativo. Assim, aos dirigentes e outros membros das ONGA que forem designados para exercer funções de representação é reconhecido o seguinte:

1- os que forem trabalhadores por conta de outrem têm direito a usufruir de um horário de trabalho flexível, em termos a acordar com a entidade laboral, desde que a respectiva actividade laboral o permita;
2- os períodos de faltas dados por motivo de comparência em reuniões dos órgãos em que os dirigentes exerçam representação ou com membros de órgãos de soberania são considerados justificados, para todos os efeitos legais, até ao máximo acumulado de 10 dias de trabalho por ano e não implicam a perda das remunerações e regalias devidas.

Mas, para poderem desempenhar cabalmente o seu papel é essencial que toda a actividade das associações seja independente, transparente e isenta face às instituições oficiais, partidos políticos, interesses económicos, corporativos e outros. Assim, consideramos que cada associação deveria ser obrigada a tornar público um relatório anual, do qual deveriam constar a composição dos órgãos sociais e respectiva acta de eleição, a descrição das principais actividades da Associação e eventuais serviços prestados a terceiros, respectiva remuneração e justificação, bem como uma lista com a proveniência e montante de todas as fontes de financiamento. No que diz ao financiamento por parte dos diversos organismos do Estado ou da Região, este deveria obedecer a critérios claros, divulgados previamente e atempado.

Terminaria apresentando mais alguns princípios que, no nosso entender, devem nortear as actividades associativas:

- Postura construtiva e dialogante. A dimensão dos problemas e, por vezes, a urgência no tempo exige cooperação, diálogo e coordenação de esforços com outras entidades.
- Dimensão de serviço. A actividade associativa deve ser aberta ao interesse público, cabendo às associações disponibilizar os seus trabalhos a todos os que os solicitem.
- Seriedade. As intervenções deverão ser fundamentadas e deverá ser recusada a demagogia e o “espectáculo pelo espectáculo”.
- Voluntariado. Embora possam ter ao seu serviço profissionais, o pilar da actividade e os cargos de direcção deverão basear-se, apenas, no trabalho voluntário.


(Texto que serviu de base a uma comunicação numa iniciativa do PSD realizada no Hotel de Ponta Delgada, em 25 de Setembro de 1999)

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