terça-feira, agosto 14, 2007




ABSOLUTAMENTE CONTRA

Vivi durante três anos, entre 1980 e 1983, na ilha Terceira, assisti a uma ou outra tourada à corda e cheguei a ir a uma tourada numa praça. Enquanto que, para mim, as touradas à corda valem pelo convívio que proporcionam, às touradas de praça não achei nem acho qualquer interesse, considerando mesmo como imoral a venda, como espectáculo, da tortura infligida ao touro. Em ambos os casos, acho que, não só pelos animais, mas também, pelo risco de vida que correm os próprios homens deveriam ser repensadas as primeiras e abolidas as segundas.
Contudo, a forte tradição da festa brava existente na ilha Terceira leva-me a não ter dúvidas quanto à inevitabilidade da sua manutenção, mas, através da oferta de um espectáculo “pleno de estética e valentia”, onde tudo fosse feito para expurgar o sofrimento do animal e em que as farpas passariam ao caixote de lixo da história.
Não foi no sentido da evolução e do progresso que se manifestaram, no passado dia 18 de Outubro, os vinte e seis deputados da Assembleia Legislativa Regional dos Açores que aprovaram a legalização da “ sorte de varas”, isto é da introdução na arena do verdadeiro assassino do touro, o picador, que montado no seu cavalo crava uma vara armada com um ferro de 10 cm, o que provoca ao animal, no mínimo, uma enorme hemorragia e rasgões musculares.
Estamos muito longe de 1567, data em que uma Bula Papal excomungava «perpetuamente» os católicos que participassem nas touradas ou mesmo de
1836, data em que o 1º Governo Liberal proibiu as touradas“ por se tratar dum espectáculo bárbaro, sangrento e fomentador da violência e do crime entre os homens”. Hoje, a igreja parece-nos conivente com a barbárie, a sociedade deixa-se levar por pequenos grupos organizados e as lideranças políticas são tão frouxas que de tudo um pouco vão permitindo.
A 6 de Agosto de 1989, o eng. Francisco S. Botelho, num artigo intitulado “Tenha juízo, senhor Secretário Regional!”, alertava para o facto do Dr. Adolfo Lima numa entrevista à RTP/Açores ter dito que a realização de uma corrida picada na Terceira era o primeiro passo no sentido da introdução dos “touros de morte” e que o turismo disso muito iria beneficiar. Espero que o que não foi conseguido na altura não esteja agora na mente dos nossos governantes. Tenham juízo!
Apelo ao bom senso dos nossos líderes políticos, em especial ao Presidente do Governo Regional dos Açores e ao líder do maior partido da Oposição, o PSD-A, para que façam algo para evitar que a “violência gratuita” seja legalizada. Com efeito, eles, poderão ser a nossa única esperança, pois como escreveu o docente universitário José Rafael Nascimento “dos líderes políticos espera-se, neste como em todos os domínios da vida pública, que assumam o sentido da História e mostrem sabedoria, convicção, pedagogia e orientação, evitando passar para a opinião pública uma descredibilizadora imagem de cegueira e impotência política, obsessão com a preservação dos cargos e recurso fácil ao populismo e oportunismo bacocos”.
Estou à espera para ver de que lado estão eles e cá estarei para continuar a luta pelo respeito para com todos os “seres que connosco partilham a mesma natureza, mas sobretudo o respeito por nós próprios, pelos valores que defendemos e pela dignidade que nos faz Homens” (Nascimento, ibidem)
Tortura não é arte nem cultura!
(Publicado no Açoriano Oriental, 28 de Outubro de 2002)

Sem comentários: