sábado, julho 28, 2007

CAÇA À BALEIA

ALGUNS DADOS HISTÓRICOS



Datados de 10.000 a.C., foram encontrados na costa portuguesa enormes arpões de pedra, com a mesma configuração dos actuais que só poderiam ter sido utilizados na captura de cetáceos. Ossadas de baleia, de 1500 a.C., encontradas nos restos das fundações originais do Alasca mostraram que os esquimós apanhavam cetáceos desde aquela data.

Os povos primitivos aproveitavam, sobretudo, os cetáceos que encalhavam. Foi a partir do século XII com os bascos que teve início a caça organizada. Por essa altura, a diminuição do número de baleias francas no golfo da Biscaia levou-os a procurá-las mar adentro, tendo chegado à Gronelândia e Terra Nova no século XVI.

A baleação portuguesa ter-se-á iniciado no século XIV. No que diz respeito aos Açores, Gaspar Frutuoso refere o aparecimento de baleias no século XVI, nas costas da ilha de S. Miguel, do seguinte modo: «saem à costa d’esta ilha, algumas vezes, baleias, mais da banda do Norte que do Sul, principalmente na costa do lugar de Rabo de Peixe, onde se acham muitas favas do mar, que dizem ser-lhe agradável e natural manjar e, posto que muitas saíssem somente se aproveita o azeite delas, sem nunca se achar âmbar». Outras referências ao encalhamento de cetáceos podemos encontrar nas Saudades da Terra, contudo a seguinte, dizendo respeito a S. Maria, é deveras interessante: «onde esta ribeira se mete no mar saiu à costa uma baleia, haverá perto de 50 anos, de cujos ossos que se pudera fazer uma cabana, em que puderam caber uma dúzia de homens, assentados à vontade».

Por altura de 1602 as técnicas de caçar baleias usadas pelos bascos são introduzidas e utilizadas no Brasil, iniciando-se o chamado ciclo baleeiro do Brasil colonial. A partir de 1614, a caça no Brasil passa a ser controlada directamente pelo reino de Portugal.

Por volta de 1644 começa a caça organizada na Nova Inglaterra, utilizando o método de empurrar os animais para a praia. Só em 1712 é morto o primeiro cachalote ao largo dos Estados Unidos. No ano de 1729 regista-se o invento, pelo Dr. Thiercelim, do sistema de «bomb-lance».

Em 1750 começa a caça em Newport e Rhode Island, por iniciativa do judeu português Aaron Lopes e onze anos depois, faz-se ao mar, nos Estados Unidos o primeiro navio com a capacidade de derreter a gordura a bordo.

Em 1765 os Norte-Americanos já caçam no Açores e em Cabo Verde e, em 1744, já chegavam ao Brasil.

Segundo capitães ingleses, as suas embarcações, em 1767, colheram nos mares dos Açores cerca de 10.000 barris de óleo. Um ofício dirigido por D. Antão de Almada ao ministro Francisco Xavier de Mendonça Furtado, datado de 19 de Julho de 1768, refere a presença nos Açores, no verão daquele ano, cerca de 200 embarcações da Nova Inglaterra que conseguiram um rendimento no valor de 800 contos, o que naquela altura era quantia bastante avultada, de tal modo que o referido capitão defendia que com eles fosse celebrado um contrato. Por esta altura, já um pequeno número de açorianos se dedicava à caça à baleia, com o objectivo de utilizar o óleo na iluminação de suas casas.

Em 1784, Dinis Gregório Meio Castro suplica à Rainha para adoptar medidas no sentido de impedir a concorrência feita pelos estrangeiros aos povos locais. Não obteve resposta.

A situação dos açorianos era deveras caricata: tendo possibilidade de se bastarem a si próprios com o óleo de suas baleias este saída para Inglaterra, sendo eles, por sua vez obrigados a comprá-lo mais caro a negociantes locais que o importavam. Um deles, Nicolau Maria Raposo que o importava do Brasil e que era detentor no monopólio da sua venda nas ilhas foi, em 1788, obrigado, devido à proibição de o vender mais caro então imposta pela Câmara, a vender o óleo que lhe havia custado 59.955 réis a pipa por 48.000 réis.

Para proteger a indústria inglesa, o governo português criara o «exclusivo contrato das baleias, para não se fazerem armações sedentárias em qualquer parte dos domínios». Essa medida foi anulada pelo alvará de 18 de Maio de 1798.

Um dos países que mais contribuiu para o aperfeiçoamento das técnicas da caça à baleia foi a Noruega. Em 1851, Svend Foyon, sem dúvida o pioneiro da caça e das indústrias da baleia, inventa espingardas que mais tarde foram utilizadas na captura de cetáceos e, em 1867, inventa um canhão muito semelhante ao utilizado actualmente. Outro norueguês, Christofersen, inventou em 1870, um guincho simples e, em 1894 um guincho duplo e uma mola em espiral.

A primeira sociedade para explorar a caça à baleia é constituída no Faial, em Fevereiro de 1857. Foi armado em baleeira o brigue Francês-Astória. Três anos mais tarde, a praça da Horta já possuía 10 baleeiras. Nas Flores, já existia pelo menos uma companhia baleeira em 1860.

Finalmente, no ano de 1862, a 26 de Maio, é publicada uma lei com o objectivo de proteger a indústria nacional de pesca da baleia.

Na Calheta do Nesquim, ilha do Pico, foi fundada a primeira armação baleeira cujo bote e seus apetrechos foram adquiridos na América pelo Capitão Anselmo. Esta terá sido a primeira companhia com botes estabelecidos na ilha, regularmente estruturada e com escritura lavrada na Horta a 28 de Abril de 1876.

A lei de 10 de Abril de 1877 vem prorrogar por dez anos as disposições da carta de lei de 1862 e amplia as garantias dadas à indústria baleeira. Nove anos depois, é publicada uma portaria do Ministério da Fazenda, de 14 de Abril, que regula a execução do artigo 5º da lei de 26 de Maio de 1862.

No ano de 1885, chegaram a S. Miguel, provenientes do Faial, duas embarcações destinadas a dar inicio à actividade naquela ilha. No ano seguinte, caça-se à baleia nos quatros portos da costa norte de S. Miguel e em Vila Franca do campo.

Segundo Afonso Chaves, em 1888, estavam em actividade nos açores 86 canoas que capturavam por ano em média, 3 cachalotes cada uma.

Em 1894, terá sido construída a primeira canoa baleeira nos Açores e, a partir de 1900, todas as canoas passam a ser construídas cá.

No ano de 1917, a faina atinge o apogeu como consequência da guerra e do constante aumento dos derivados do cachalote.

Com a paz, a mão-de-obra a escassear face à quebra do preço do óleo e à possibilidade de arranjar empregos mais estáveis, menos perigosos e melhor remunerados. A industria no distrito da Horta passa por uma situação menos boa, de modo que, em 1938, a rivalidade devido à utilização dos «gasolinas» e atraso no pagamento das soldadas, faz com que seja pedida a intervenção do Estado.

Em S. Miguel, no ano de 1936, exploram a actividade três companhias, uma na Bretanha e duas nas Capelas. Em S.Vicente Ferreira, freguesia vizinha das Capelas, dois anos antes havia sido construída uma fábrica, no lugar dos Poços.

Na década de 40 baleeiras das Lajes do Pico vieram balear para São Miguel. Manuel Moniz Barreto e José de Brum balearam na Bretanha e Manuel Pereira Monteiro Júnior estiveram a balear nas Capelas.

Com a 2º guerra Mundial novo impulso surge e a actividade atinge o auge. A guerra, constituindo um impedimento para o desenvolvimento da industria, em muitos países as frotas baleeiras ficaram ancoradas nos seus portos e muitos barcos foram transformados para fins militares fez com que o nosso óleo tivesse uma procura que jamais conheceu. Durante este período, o número de embarcações aumenta, as capturas também de modo que chegam a representar 12.3% no conjunto das capturas mundiais. A proliferação de armações era tal que o governo viu-se obrigado a proibir a implantação de outras onde já existisse alguma. Construída a fábrica de Porto Pim, generaliza-se o reboque por lanchas, chegam os primeiros aparelhos de rádio, etc.

O ano de 1941 marca o início da actividade baleeira na ilha da Madeira. Em 1944, por iniciativa de 17 países, é criada a Comissão Baleeira Internacional (CBI).

Na década de 60, a montagem de fábricas de conserva de peixe, o incremento da pecuária, a emigração e as alternativas criadas pela industria ao óleo da baleia, trazem dificuldades ao seu escoamento e muitas companhias fecharam.

Em 1974, existiam nos Açores apenas 13 baleeiras e 15 lanchas pertencentes a oito sociedades.

Em 1981, a directiva europeia (348/81) proíbe a importação de todos os produtos derivados de cetáceos no espaço económico da Comunidade Económica Europeia.

Em Julho de 82, reunidos em Brigton Inglaterra, representantes de 39 países decidem proibir a caça à baleia a partir de 1985. Portugal ratifica a Convenção sobre o Comeércio Internacional das Espécies de Fauna e de Flora Ameaçadas de extinção, que inclui o cachalote no anexo I – comercio estritamente proibido.

Em Agosto de 84, ano em que foram capturadas 63 cetáceos, as armações baleeiras de Pico e Faial possuíam em «stock» 452 toneladas de óleo de cachalote. No primeiro semestre daquele ano, graças a um subsídio de 6$00 por kg, atribuído pelo Governo Regional, foram comercializadas 648 toneladas. Apenas a firma «Armações Baleeiras Reunidas», em S. Roque do Pico, continua a laborar. Em Outubro do mesmo ano, a «corretora» divulga a intenção de voltar à actividade, com base em S. Miguel, onde possui a fábrica nos Poços, fechada desde 1972.

O jornal «Correio dos Açores», de 7 de Julho do presente ano, noticia a existência de um projecto financiado pela Comunidade Europeia através das «Organizações Europeias para a Protecção Animal» que poderá atingir as 55.110 libras e que tem como objectivos investigar a possibilidade de observação das baleias o que poderá representar o nascimento de uma nova industria turística» e seria uma alternativa económica à sua caça.

Fernando Wallenstein Teixeira, segundo o Açoreano Oriental, de 13 de Agosto, está a desenvolver esforços no sentido de reiniciar a caça nas Capelas, tendo-se mostrado optimista quanto à concretização daquele seu objectivo.

Finalmente a 21 de Agosto, depois de 3 anos de interregno, pescadores das Lajes do Pico caçaram um cachalote de 20 toneladas e 15 metros de comprimento, a cerca de 15 milhas da costa.

Teófilo Braga (membro dos Amigos da Terra / Açores)

(Publicado no “Correio dos Açores”, de 23 de Setembro de 1987)

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