sexta-feira, dezembro 29, 2006

Carta Aberta aos Partidos Políticos

Na presente campanha eleitoral para a Assembleia da República, todos os partidos políticos têm utilizado temas ecologistas quer nos seus manifestos eleitorais quer nos programas de Governo que apresentam ao eleitorado.
A utilização de temas ecologistas nas campanhas eleitorais, para além de constituir uma forma oportunista (ou não) de arrecadar o maior número de votos possível do eleitorado, sobretudo dos sectores mais sensíveis para as questões do ambiente e da ecologia, mostra a universalidade e a necessidade do discurso ecologista. Por tais motivos, urge, desde já, esclarecer duas questões:

O que pretende o movimento ecologista independente?
Será o ecologismo um movimento de esquerda ou de direita?

Em relação à primeira questão trata-se de se saber o que, afinal queremos: “Um capitalismo que se acomode às pressões ecológicas ou a uma revolução económica, social e cultural, que vá abolir as pressões do próprio capitalismo e, consequentemente instaurar uma nova relação entre o homem e a colectividade, o meio ambiente e a natureza” (Michel Bosquet). A segunda alternativa é, não termos duvida, a opção dos ecologistas.

No que diz respeito à segunda questão já por várias vezes afirmamos que a ecologia não é uma questão de direita ou de esquerda. Trata-se, sim, de uma questão de vida ou de morte. De facto, a crise ecológica que atravessamos não poderá encontrar soluções na via produtivista seguida quer a Oeste quer a Leste.

A degradação da vida nas cidades, o excesso de poluição, o problema dos resíduos radioactivos, o esgotamento dos recursos naturais, o desemprego, etc, só poderão ser resolvidos com um novo modelo de sociedade (que poderá ser construída hoje mesmo, se nós quisermos) que promova a autogestão dos meios de produção, a criação de pequenas unidades de produção que pelas suas próprias características favorecem a criatividade humana, a descentralização administrativa, a reconversão das industrias bélicas em civis, a criação de uma alternativa humanista e não violenta à defesa nuclear, etc., etc.

Por último, gostaríamos que todos, mas todos os Partidos políticos se pronunciassem acerca se algumas reivindicações, que fazemos e que, quanto a nós, poderão ser implementadas a curto prazo.

Aqui vão elas:

Ratificação, pela Região, dos convénios internacionais sobre o meio ambiente.

Implementação, na Região, das medidas necessárias ao respeito pelos pareceres da Comissão Baleeira Internacional e aos acordos dos C.I.T.E.S e extensão a esta do decreto-lei 263/81, de 3 de Setembro.

Criação de legislação adequada com vista à protecção da Z. E. E que proteja a pesca e a fauna marinha e se oponha à contaminação das nossas águas costeiras.

Implementação de culturas agrícolas diversificadas e favorecimento de cultivos que aumentem a fertilidade do solo e contribuam para parar com a erosão aquífera do subsolo.

Supressão gradual de produtos fitofármacos na agricultura. Actualização da legislação sobre a homologação destes produtos e criação de uma lei-quadro que limite a sua utilização. Promoção da investigação e do desenvolvimento da luta integrada e biológica contra as pragas.

Condenar a construção de unidades energéticas de origem nuclear no Continente português e combater o despejo de resíduos radioactivos no Atlântico.

Promover estudos e apoiar o incremento da produção energética alternativa e definir/executar uma politica regional de conservação de energia.

Proibir as garrafas não reutilizáveis e estimular a reciclagem do papel. Evitar a proliferação de detergentes e bebidas gasosas, através de condicionamentos legislativos. Favorecer e incrementar a utilização colectiva dos bens de uso

Redução da jornada de trabalho com vista a diminuir o desemprego e incrementar a criatividade humana. Incentivar o “produza você mesmo”.

Dar prioridade aos transportes colectivos não motorizados nas cidades. Melhorar as vias actualmente existentes.

Elaboração de um programa educacional que se dirija ao desenvolvimento da autonomia e criatividade dos indivíduos, que tenha em conta os novos meios de comunicação e integre o ser humano no meio em que vive e na Natureza.

Fomento da medicina preventiva e dos métodos naturais de combate às doenças. Recusa de unidades hospitalares desumanas e demasiado grandes. Controle rigoroso dos produtos farmacêuticos.

Fiscalização da qualidade dos artigos de consumo, através de organismos administrativos em que estejam representadas organizações de consumidores.

Recusa da instalação de armamento nuclear no nosso País ou da sua passagem pelas nossas águas territoriais. Diminuição progressiva das despesas militares e consignação de parte da verba destinada às Forças Armadas à implementação de um instituto nacional de estudo sobre a defesa não violenta.

Criação de um estatuto de objector de consciência ao serviço militar que corresponda as razões éticas, morais ou políticas que a este presidam. Reconversão gradual das indústrias militares bélicas e controlo de todo o comércio de armas, que no nosso País encontra trave giratória.


(Publicado no Correio dos Açores, 21 de Abril de 1983)

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