sábado, março 04, 2017

Fajã do Calhau segundo Veríssimo Borges

Ecologia da Paisagem- Apresentação do caso das obras de “acesso” à Fajã do Calhau
Em S. Miguel – Açores

16/02/2008



As Alterações Climáticas e o desafiam os atrasos do enquadramento de uma ERDSA (Estratégia Regional para o Desenvolvimento Sustentável dos Açores), nomeadamente em termos de Ordenamento do Território com especial ênfase nos POOCs (Planos de Ordenamento da Orla Costeira) e da sustentabilidade dos investimentos à luz de que, com recursos escassos, o que se faz num projecto é feito à custa do que deixa de ser possível fazer noutros.
Neste enquadramento há que ter em conta não só o respeito pelas boas práticas, que inclui projecto, EIA, concursos públicos e clara definição de objectivos sustentados realisticamente nas vertentes Ambientais, Sociais e Económicas, como o respeito pela legislação em vigor, que inclui a “Governance” (a responsabilidade das Instituições) e a transparência de processos.
Quando se faz uma ponte, uma barragem, uma estrada, etc. há à partida a definição de objectivos, a definição de resolver necessidades da população e da economia respeitando os problemas ambientais.
Muitas vezes a análise destes projectos é mal feita ou viciada conduzindo a resultados nefastos que podem sempre ser assumidos como incompetência ou crime das entidades responsáveis.
O mesmo não se pode aplicar quando de forma clara e descarada um presidente de Câmara viola o PDM, as boas práticas, e assume viabilizar e assumir os custos de uma ponte para a sua residência construída em zona “Non Edificandi”.
São estes alguns dos aspectos envolvidos na obra em curso do 3º acesso à Fajã do Calhau.
Tivesse esta obra como destino melhorar a acessibilidade a uma população residente nesta Fajã, como ainda acontecia no princípio do século passado e estaríamos a discutir a necessidade das boas práticas (projecto, viabilidade e EIA).
Na ausência de habitantes, mais do que insustentável a obra começa por ser inútil e vítima de caprichos inconfessáveis.
Em segundo lugar, para além de não ser admissível fazer obras desta magnitude, dificuldade e risco, sem projecto e avaliação de custos e exequibilidade à priori, esta não pode ter como objectivos viabilizar utilizações “turísticas” que o POOC proíbe: Trata-se de uma zona definida como “Non Edificandi” por riscos múltiplos (erosão costeira e erosão de falésia).
Em terceiro lugar, agravada pelas presumíveis alterações climáticas, em curso, o que resta desta Fajã tem de ser assumido como economicamente inviável de defender face à conquista acelerada da erosão marinha, que dá uma esperança de vida a esta nesga de terra provavelmente inferior a uma geração.
Acresce que mantém-se a possibilidade desta obra, apesar de consumir uma enorme fatia do orçamento e recursos da Direcção Regional das Florestas, com enormes custos de oportunidade, poder mesmo assim ser inexequível (veja-se as derrapagens de tempo e investimento, que têm resultado da ausência de projectos e ignorância dos pareceres do LREC, com sucessivas mudanças de traçado e real incapacidade de atravessar em ponte a “Grota Funda”).
Além do mais pretendem dividir na fase terminal, com a “estrada”, transversalmente o estreito terrenos da Fajã, destruíram e inviabilizaram os acessos pedestres da Água Retorta e não resolvem a perigosidade do actual acesso pelo Faial da Terra.
Acresce a este ninho de prepotências, ilegalidades e incompetências, para além do Iceberg das despesas envolvidas (para já muito mais do que uma dezena de milhões de euros) os já reconhecidos e identificados danos “colaterais” que incluem no POOC (projecto 1.1.3) uma verba de 2,5 milhões de euros para a “renaturalização” das cicatrizes provocadas pela obra (replantação de endémicas).
Esta zona, classificada como IBA, nomeadamente por estar intrusida numa das principais zonas de nidificação dos Cagarros, espécie protegida nos Açores. Foi selvaticamente devastada sem nenhuma precaução de minimização de impactes, nem sequer um prévio estudo de incidências ambientais.
Assim, o melhor que se deseja é que o fiasco desta obra absurda e das ilegalidades envolvidas, eventualmente acrescidas pela natureza não permitir o seu terminus, possa vir a servir de vacina para asneiras e ilegalidades semelhantes não se virem a repetir no futuro.
No entanto a situação é sombria já que começam a estar em perspectiva projectos igualmente desgarrados de boas práticas e sustentabilidade, com a prevista 2ª via de acesso à Ribeira Quente, onde mais uma vez se utilizam os serviços “clandestinos” dos Recursos Florestais para executar “obras de arte” que a serem feitas por quem de direito, a SRHOP, com a utilização das “boas práticas” ficariam por isso “muito mais caras”.
A obra da Fajã do Calhau surge assim como o caso mais eloquente e ainda em curso de crime ambiental nos Açores, acrescido de inutilidade ridícula, teimosia absurda e insustentabilidade merecedora de prémio no Guiness.
Não é por acaso que mereceu reportagem na Euronews, no verão de 2007, que passou mais de 20 vezes e foi repescada como das melhores do ano para re-emissão nos resumos anuais do fim do ano.
Esta é uma importante nódoa para as entidades responsáveis dos Açores e exemplo de destruição gratuita de ecossistemas e desintegração paisagística que não devemos tolerar, mas que aconteceram e estão acontecendo.
Este é um bom exemplo de que em vez de um artificioso 2º lugar dos destinos turísticos sustentáveis que o Geografic Magazine atribui aos Açores, a nível mundial, com práticas destas estamos a trabalhar para ficarmos não em último lugar, mas sim fora da escala!
MEA- 2008 – Ambiente e Paisagem
16/02/2008
Veríssimo Borges
Bibliografia:
- Comunicado de Imprensa Quercus
- Comunicado de Imprensa SPEA
- Comunicado de Imprensa CCPA
- Carta Quercus/SPEA/CCPA ao Presidente do GRA
- Resposta da SRAF
- etc.

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